De Sapesal para o mundo, conheça a história de uma das duplas mais importantes da música sertaneja de raiz.
Era comum os moradores de Sapesal, pequena cidade do interior de São Paulo, pararem em frente à casa do Seu Bertholdo, alfaiate, e de Dona Maria, costureira, para ouvir as músicas que os dois cantavam enquanto terminavam a encomenda de alguma roupa. Era comum, também, ver o casal, nos finais de semanas e feriados, organizando festas ou se juntarem a rodas de violeiros levando as filhas – Mary Zuil (Ourinhos, SP) e Marilene, (Palmital, SP) a menorzinha – que acompanhavam tudo com aqueles olhos azuis brilhando a cada acorde, a cada som.
Era lógico que, nesse ambiente alegre, as crianças logo se interessassem pela música, e Mary, aos cinco anos começou a cantar. Mary aprendeu a tocar Sanfona, e Marilene viola e violão.
Por sua voz bonita, pela sua beleza, os moradores da cidade insistem e Seu Bertholdo leva a filha para cantar na Rádio Clube Marconi de Paraguaçu Paulista, no programa de Sidney Caldini.
Contam que um dia, quando Mary estava ensaiando, Marilene entra, sem ninguém perceber, e começa a cantar em dueto. Naquele momento nascia a dupla que hoje é considerada a mais antiga do Brasil e que tem encantado gerações: As Irmãs Galvão.
O sucesso das meninas foi tão grande que sua família mudou-se para uma cidade maior, Assis, onde elas foram contratadas pela Rádio Difusora, para se apresentarem no programa “Pinguinho de Gente”. Logo em seguida seu pai as leva para Maringá, no Paraná, onde, na Rádio Cultura, tiveram um programa próprio e passaram a ser o xodó da emissora que, com orgulho, as apresentavam a todos os cantores famosos que vinham para seus shows. E, invariavelmente, Seu Bertholdo ouvia:
– Leve essas meninas pra São Paulo. Lá é o lugar delas!
Em 1952 o velho pai, idealista, vende tudo o que tem e parte para a cidade grande levando dona Maria e as filhas. Houve críticas dos parentes, moças de família não freqüentavam o ambiente de rádio. Afinal, a vida artística era sinônimo de perdição. Mas, felizmente para a música brasileira, Seu Bertholdo não deu ouvidos a ninguém.
Em São Paulo, na Rádio Piratininga, elas se apresentam no programa de calouros de Salomão Esper, Torre de Babel, que fazia grande sucesso. A dupla cantou e não conseguiu parar, tal o entusiasmo do público, dos técnicos e artistas que faziam o programa. Foram, imediatamente, contratadas como profissionais. Mary tinha 12 anos e Marilene 10.
Millor Fernandes, à maneira de Guimarães Rosa, diz que “para uns as vacas morrem, para outros até boi pega a parir.” Para aquelas duas crianças, o boi começava a parir: A Rádio Nacional as ouviu, propôs um cache maior e levou-as para o programa Ronda dos Bairros.
Mais uma vez Seu Bertholdo e Dona Maria arrumavam as malas e pegariam a estrada, uma estrada que seria marcada pelo sucesso e pelas luzes que iluminavam essas duas irmãs geniais, as Galvão.
O programa Na Serra da Mantiqueira, comandado pelo Comendador Biguá, era outro grande sucesso e a Rádio Bandeirantes não podia deixar de ter essas duas meninas, cujos nomes já eram pronunciados com admiração pelos profissionais e pelos ouvintes. Daí para o Brasil Caboclo, programa de maior audiência no país, comandado pelo Capitão Barduino, foi um pulo. E foi ouvindo esse programa que Diogo Molera, o Palmeira, diretor artístico da RCA, previu o futuro da dupla e a convidou para gravar. Imediatamente levou-a para o Rio e lá veio à luz o primeiro 78 rpm das Galvão, em 1957.
Vencia mais uma etapa essas artistas brasileiras, universais, que ganhariam prêmios e mais prêmios, cantariam em circos, estações de rádio, cinema e TV e seriam consideradas ícones da música sertaneja.
Pertencentes aos quadros da RCA por mais de vinte anos, receberam o Troféu Oceania do UASP (União dos Artistas Sertanejos de São Paulo), Disco de Ouro com a música “No calor dos teus braços”, Prêmio Sharp com “Lembranças”, Prêmio Caras de Música com “Nós e a Viola”, etc., etc., e etc.
Na televisão, cantaram no programa Canta Viola, de Geraldo Meireles na TV Cultura; Viola minha Viola, de Inezita Barroso, também na Cultura; Som Brasil, de Rolando Boldrin (que depois foi substituído por Lima Duarte) na TV Globo; Especial Sertanejo, de Marcelo Costa, na Record, etc., etc.
Toni Gomide, em Abrindo o baú, Rádio Tupy AM, chamou-as de AS VOZES DO SÉCULO, título feliz e justo para coroar a carreira dessas duas cantoras que sempre engrandeceram a música popular brasileira. E hoje, não são apenas os moradores de Sapesal que param para ouvir as duas crianças. Hoje é o Brasil que para, em frente às lojas de TV, perto dos alto-falantes dos parques, nos bares, nas festas, nos rodeios, etc., etc., para ouvir aquelas duas crianças de olhos muito azuis, vozes belíssimas, talento genial que ganharam o mundo. Para ouvir AS GALVÃO.
Discografia básica:
CD Lembranças, 1992 (Warner)
CD Olhos de Deus, 1996 (Continental)
Por: Yassir Chediak para o Sertanejo Oficial
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