O impacto da Inteligência Artificial na música: inovação ou ameaça?
A ascensão do uso da Inteligência Artificial na música tem gerado um intenso debate sobre os limites entre inovação e violação de direitos autorais. Uma recente decisão da Sony Music, de remover mais de 75 mil faixas criadas com IA, evidencia o impacto crescente dessa tecnologia no setor. O avanço acelerado das ferramentas de IA levanta questões urgentes sobre propriedade intelectual, autenticidade artística e remuneração justa para criadores.
A revolução da IA na criação musical
A Inteligência Artificial já é amplamente utilizada na música a algum tempo, desde a composição de melodias inéditas até a recriação de vozes e estilos de artistas famosos. Ferramentas como o SUNO, Google MusicLM e OpenAI Jukebox demonstram a capacidade da tecnologia de gerar harmonias e letras que poderiam facilmente ser confundidas com criações humanas. Para produtores e músicos independentes, essas inovações representam oportunidades de experimentação e acessibilidade, democratizando a produção musical.
No entanto, a mesma tecnologia que facilita a criação também possibilita a proliferação de deepfakes musicais. A reprodução não autorizada de vozes e estilos de artistas renomados, como Beyoncé e Queen, demonstra o potencial da IA de comprometer a autenticidade das obras e gerar prejuízos comerciais para os detentores de direitos autorais.
Os desafios legais e comerciais
A legislação de direitos autorais, formulada para proteger obras criadas por humanos, ainda não acompanhou completamente a evolução da IA. Quem detém os direitos sobre uma música gerada por um algoritmo? Como garantir que os artistas cujas vozes foram replicadas sem permissão sejam devidamente compensados? Essas são questões que desafiam advogados e legisladores em todo o mundo.
No Brasil, o O Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD) tem acompanhado atentamente o avanço da Inteligência Artificial (IA) na indústria musical. A entidade expressa preocupações em relação ao uso da IA generativa na criação de músicas, destacando que A entidade destaca que a produção de conteúdos a partir de obras protegidas por direitos autorais, sem a devida autorização, pode infringir a legislação vigente no Brasil.
Além disso, há uma preocupação específica relacionada à arrecadação de direitos autorais. Músicas criadas exclusivamente por IA podem não ser elegíveis para proteção autoral tradicional, o que impactaria a legitimidade do ECAD em arrecadar e distribuir valores referentes a essas obras. Essa situação levanta debates sobre a necessidade de adaptar as regulamentações para contemplar as novas realidades impostas pela tecnologia.
As gravadoras, por sua vez, têm adotado medidas rigorosas para conter a disseminação de conteúdos não autorizados. A Sony Music, por exemplo, tem monitorado e removido ativamente gravações que utilizam IA para imitar artistas de seu catálogo. Essa postura reflete o esforço das grandes empresas para proteger seus ativos e evitar que o mercado seja inundado por músicas que não respeitam os direitos dos criadores originais.
Artistas brasileiros também são afetados
A evolução e o uso da Inteligência Artificial na música tem gerado preocupações entre artistas brasileiros, que temem o uso indevido de suas vozes e estilos em criações não autorizadas. Diversos músicos nacionais têm se mobilizado para proteger seus direitos e preservar a autenticidade de suas obras.
Em abril de 2024, mais de 200 artistas, incluindo nomes internacionais como Nicki Minaj, Sam Smith, Billie Eilish e Stevie Wonder, além dos brasileiros Carol Biazin e Mumuzinho, assinaram uma carta aberta organizada pela Artist Rights Alliance (ARA). O documento solicita proteção contra o uso irresponsável da IA na indústria musical, destacando preocupações sobre a utilização não autorizada de obras e a possível substituição de artistas humanos por imitadores gerados por IA (UBC).
Outros artistas brasileiros, como Lauana Prado, Simone Mendes e a banda Maneva, também aderiram a essa iniciativa, reforçando a necessidade de regulamentação do uso da IA no setor musical (Terra).
Casos específicos ilustram os desafios enfrentados. A voz do falecido cantor Renato Russo foi recriada por IA para interpretar a música “Batom de Cereja”, da dupla Israel & Rodolffo. Embora a tecnologia tenha permitido essa inovação, o espólio do artista solicitou a remoção da versão, levantando debates sobre direitos autorais e ética no uso de deepfakes musicais (Nova Brasil FM).
O futuro da IA na música
O uso da Inteligência Artificial na música não pode ser ignorado, tampouco simplesmente combatido. Assim como em outras áreas criativas, a tecnologia pode ser uma aliada poderosa quando usada de forma ética e regulamentada. Algumas possibilidades incluem parcerias entre artistas e IA para criar novas experiências sonoras ou o desenvolvimento de plataformas que garantam a remuneração justa para aqueles cujos estilos ou vozes são utilizados em criações assistidas por IA.
O grande desafio da indústria musical será encontrar um equilíbrio entre inovação e proteção dos direitos autorais. A IA continuará a evoluir e transformar a forma como a música é criada e consumida, mas a questão central será definir regras claras para que essa evolução ocorra de maneira sustentável para todos os envolvidos no setor.
Enquanto isso, as gravadoras e os próprios artistas precisarão se adaptar rapidamente às novas realidades do mercado, assegurando que a música, seja ela feita por humanos ou com auxílio da tecnologia, continue sendo uma expressão autêntica e valorizada da criatividade humana.